terça-feira, dezembro 28, 2004

A K.

Primeiro de tudo, o comentário foi o primeiro realmente crítico. Por isso estou agradecido. Procuro sobretudo o debate de ideias com este blog. É certamente a primeira vez que tal acontece. Terá sido com o texto que em meu entender menor razões apresentava para tal. Não é pretencioso e muito menos de "apologia depressiva" daquilo que representa o Natal. Passo o Natal com imensa alegria e sinto-me um terrorista da alegria quando vou às compras. Chego mesmo a sentir, por breves instantes, que as decorações não são pirosas :) E no Natal é, de facto, "mais fácil sorrir". Este texto, básico, sem qualquer pretensão, é um mero desabafo, não porque quero mudar o mundo, mas porque o mundo não quer ser mudado, aliás acredito que falar em mudar o mundo é, no mínimo, ingénuo, até mesmo infantil, e deverá ser apenas discutida a capacidade que possuímos de mudar a nós próprios mantendo, é claro, a esperança que o mundo mude connosco. EU fico abstraído do mundo nesta época, mas isso não significa que ele não exista lá fora. E pior que não saber é não querer saber. E doce K, o mundo ainda gira no Natal ,tanto no bom, como no mau. Mas jamais contenhas a tua alegria. Assim como, pelo menos assim me parece, jamais deverás esquecer que há muito a mudar, mesmo no Natal. Um dos grandes males deste mundo é precisamente o não "pensar os problemas que este mundo nos proporciona". E agora que penso nisso deveriamos todos, inclusivé eu, porque também esqueço, também prefiro esquecer, aprender que os valores humanos não devem ser esquecidos em determinadas épocas e reacendidos noutras. Talvez os teus valores sejam diferentes dos meus. Talvez prefiras passar esta época festiva sem reflectir sobre aquilo que vai mal. A mim parece ser a época ideal para isso.
Talvez o desastre provocado pelo terramoto recente venha demonstrar a ti que o mundo não para nunca, por muito que desejemos, por muito que fechemos os olhos. As coisas más continuam a acontecer.
O texto não é uma crítica à alegria, mas um lembrar, um mero lembrar. Porque acredito que é bom não esquecer. Acredito com todas as minhas forças. O facto de existirem pessoas que se lembram e lutam para contrariar as coisas, mesmo quando é Natal, faz a minha alegria pois me dá esperança. O facto de existirem pessoas que olham para o lado, não só no Natal, faz com que por momentos não goste do Homem.
Talvez a culpa seja minha pela brevidade e simplicidade do texto que possam a levar a interpretações erróneas do mesmo. Espero que compreendas um pouco melhor agora o objectivo. É verdade que estava a "calcar" um pouco o Natal, mas eu não escrevo para a Maria. Escrevo se sinto a necessidade de desabafar. E senti.
Por fim digo-te que não necessitas de ficar triste, basta apenas que te lembres e lutes, por que a meu ver é bem melhor que esquecer porque é Natal, ou porque é Ano Novo, ou porque é Páscoa, ou porque não apetece.
Talvez os teus valores sejam diferentes dos meus. Mas vou pensar um pouco mais nisso.

sexta-feira, dezembro 24, 2004

Vejo as ruas com filtro vermelho e dourado. A luz está em cada canto. Enfeites pirosos, frases balofas, consumismo exacerbado, hipocrisia e etc. Todas essas e muitas, muitas mais, coisas que nos fazem odiar o Natal.
E no entanto torna-se mais fácil sorrir. Um pequeno embrulho só para nós e o mundo parece um pouco melhor. Não o é. Há crianças a morrer à fome, pessoas a morrerem como resultado de guerras, de ódios, de ganância, escravatura, exploração, violência de todas as formas e feitios. Pobres esganados de fome e ricos com enfartes causados por gordura em excesso.
Mas enfim é Natal e para alguns hoje é um bom dia. Para eles: BOM NATAL. Para os outros: BOM ANO NOVO.

E só para lembrar quem acredita: Parabéns ao menino.

segunda-feira, dezembro 13, 2004

No fundo

No fundo, no fundo, a culpa é do PR. Esse malvado, pervertido, sacana irresponsável. Como teve ele a lata de dissolver a assembleia? Ele devia era ter logo demitido o governo por incompetência. Mas não! Deu-lhe para ser um gajo porreiro e não envergonhar ainda mais o governo. E claro o Santa não compreende porquê. E pergunta. E volta a perguntar. E pergunta ainda uma vez mais. E continua sem compreender. E o PR diz: "Voçês sabem do que eu estou a falar". Mas eles não sabem. Convenhamos. O PR de facto até foi um gajo porreiro. O discurso não foi barroco. Ele tentou explicar. Mas o Santa não compreende. "Que fiz eu?" - pergunta-se. Mas eu compreendo a dificuldade de explicar do PR. Eu próprio não saberia por onde começar. Mas já lá diz o ditado: "Governo que nasce podre, cai fodido!"

Fiquei a saber que a Odete, a cara Odete, anda metida na revista à portuguesa. De política à revista. É sempre bom subir de nível de vez em quando.

quinta-feira, dezembro 02, 2004

segunda-feira, novembro 08, 2004

Duas palavras bonitas

Decidi explorar o potencial ridículo de frases tão em moda hoje em dia:
Partirei da minha preferida e daí formularei umas quantas mais tendo em conta o carácter inerente da primeira.
As palavras são:
"Descriminação positiva"
Daqui partimos para uma parafernália de frases construídas a partir da lógica da primeira, i.e., da lógica do absurdo:
Racismo tolerante

Egoísmo altruísta

Tortura benovolente

Arrogância humilde

Brutalidade suave

Golo falhado

Quente gelado

Político preocupado com o povo

e muitas, muitas mais.




quinta-feira, novembro 04, 2004

Digámos não!

Ele ganhou e não vale a pena estar a discutir mais isso. Se bem que era bom que a América se fodesse sozinha.
Mas leio as cartas e rápidamente relembro que há bem mais aqui com que me preocupar. Daniel Sampaio fala-nos bem de dentro e de problemas que não podemos ignorar. E jovem como sou não encontro paternalismo de qualquer espécie mas unicamente um apelo. Um apelo que faço a mim e áqueles que me rodeiam. Suas palavras vão de encontro a uma realidade inegável. A ameaça de retrocesso democrático, de negação de um contrato social é cada vez maior e a minha geração está silenciosa. O humor cresceu a olhos vistos, como acontece sempre em tempo de crise, mas é necessário acordar pois a crise é aspecto pouco quando nos querem roubar aquilo que foi alcançado, ou melhor, conquistado, em consequência do 25 de Abril. A prepotência, a arrogância, a falsidade abunda neste governo que cada vez mais mostra todo o seu carácter de direita. A conservação de interesses económicos é factor único. O lucro o objectivo. Não a igualdade social, não a elevação ética, moral e cultural do cidadão. Quem não o vê, limita-se a não o querer ver. E é triste para mim analisar a minha geração. Uns simplesmente não possuem qualquer tipo de discernimento politico-social (apesar de instruidos) e ouvimos dizer: "a política não me interessa". Perguntamos: "Estás morto?". Outros colaboram com o governo. E isto é triste, especialmente quando vemos isso na vida estudantil, em que muitos creem que uma associação de estudantes é o primeiro passo para a vida política. Os tachos formam-se cedo. E não vemos o movimento estudantil como uma força política independente e progressista como deveria ser, mas antes um trampolim para o mundo político. E isto entristece. Mas há ainda os revoltados, mas não existe coerência, nem uma real união. Existimos (incluo-me nestes últimos. Mea Culpa) dispersos e não poderemos jamais ser voz de revolta. Ainda se riem de nós. E eu não gosto que se riam de mim.
E tu, gostas que se riam de ti?

Digámos não!

sexta-feira, outubro 01, 2004

Agora e Sempre

Pois é, o Sócrates ganhou.
Gostava de poder dizer um pouco mais, mas a verdade é que não há mais nada a dizer. Tal facto em nada vem mudar o meu dia-a-dia. Não há tristeza, nem alegria. Apenas apatia. Nada mudou verdadeiramente. Haverá um governo a explorar o coitadinho e uma oposição. Projectos verdadeiros para o país, para o comprimento de um contracto social verdadeiramente justo não passaram a existir. Tudo está igual. Para não dizer pior. Senão vejamos: as minhas propinas voltaram a aumentar (lá vem aquele artigozito da constituição outra vez). As empresas (e principalmente as portuguesas) continuam a acreditar que os lucros são maiores quando pagam pouco e reduzem o pessoal. Honestamente. Se isto não é a lógica do absurdo, então o que é? Quem compra os serviços são as pessoas. Se estas não tiverem dinheiro para gastar então as empresas não terão receitas. Será assim tão difícil compreender isto. A solução é sempre a mesma: manter os salários baixos, reduzir pessoal, aumentar os preços. Se os preços aumentam e mais pessoas estão desempregadas, menos pessoas poderão consumir os produtos. É preciso ser economista para conseguir explicar como é que estas soçuções são as correctas. Meus amigos isto é cíclico. E é óbvio que se as pessoas gastam menos, então as receitas fiscais são menores, po que é ainda mais preocupante se tivermos em conta que as receitas vêm, essencialmente, das pessoas e não das empresas, que na sua maioria fogem aos impostos. E se há mais pessoas desempregadas, maiores são os gastos no apoio social. A solução adoptada parece surgir (não consigo ver outra razão) por simples incapacidade do meio empresarial português de funcionar como um todo. Cada um joga para seu lado. Isolados compreendemos que necessitem de optar por soluções destas. E o resultado disto é o lento desaparecimento da classe média. O desaparecimento das empresas que não possuem recursos. O fosso entre ricos e pobres aumenta gradualmente. O resultado: revolta social. Os pobres serão sempre em maior número. Este é o futuro se as coisas continuarem desta forma. A solução passa sempre por sobrecarregar os que estão na classe média. Esta não é a solução. O problema reside no fosso social. A solução é a sua redução. A única maneira de termos um mercado financeiro rico é havendo dinheiro naqueles que usufruem dele. Em vez da criação de portagens, de novos impostos, de taxas e afins para cobrir a despesa pública, porque não taxar o mercado da especulação financeira, porque não reduzir as forças armadas a um nível necessário à preservação da sociedade e serviços verdadeiramente necessário ( Porque não podemos comprar submarinos quando nem dinheiro para a gasolina das lanchas que patrulham o nosso mar temos). Agir de acordo com a nossa dimensão. Porquê gastar milhões numa mudança de índole populista como a mudança dos ministérios, ou construir dez novos estádios quando o nosso património imobiliário se degrada a olhos vistos? Porque eu estou literálmente a cagar se Portugal possui dez estádios modernos quando em minha casa o tecto me cai na cabeça. Mas o povo português é extremamente comodista. Mas não exagerem! Tiraram-lhe a educação. Começam a tirar a saúde, os empregos, a esperança de um futuro. Políticos tentam cobrir a situação com orçamentos enganadores, previsões totalmente erradas, mas a realidade não está no papel. É sentida por cada um de nós a cada dia que passa. E isso ninguém pode esconder. Se há dois anos atrás estavamos de tanga, de tanga continuamos. "as joias penhoradas" e sem soluções. O arrojo da venda da propriedade do estado para equilíbrio de orçamento revelou ser infrutífero e digo eu contrapruducente. O ministro das finanças concorda. Mas e a solução? Por onde anda? Este governo é capaz de a ter (não acredito nisso, mas imaginemos). No entanto que crédito poderemos dar a um governo que não foi escolhido por nenhum de nós, que logo a começar revelou aspectos no mínimo pouco éticos? A secretária que de manhã era da defesa e à tarde da cultura (tacho), a reforma da caixa para alguém k trabalha um ano e meio e não cumpriu correctamente com a sua função (injustiça social), a relações públicas na pj (mais uma vez, tacho), o programa das colocações encomendados a uma empresa de um membro do psd (favoritismo), e muitas, muitas coisas mais que desconhecemos. Que crédito poderemos conceder a políticos que nos revelam que funcionam na base de interesses pessoais e esperam a apatia do povo? E o discurso de a culpa ser do governo anterior? Que raio é isso? O governo era PSD/PP. Nesse aspecto nada mudou. Grande parte da equipa manteve-se. Que crédito deverei eu conceder? Nenhum. Absolutamente nenhum. E a oposição não está melhor. Eu pergunto-me, será que não é possível termos um governo, uma oposição, um parlamento a trabalhar verdadeiramente em conjunto para o futuro de Portugal? Não compreenderão que isto não é uma corrida? Não há vencedores. E insisto uma vez mais. A educação é a única coisa que pode alterar o nosso futuro. A base de toda e qualquer civilização é a educação da mesma. Ao longo dos anos, principalmente estes últimos os que deveriam ser beneficiados por esta têm sido extremamente prejudicados. E é óbvio que muitos dos problemas advém deste facto. Continuamos um povo ignorante e incapaz. Culpa dos políticos que governaram e/ou fizeram oposição. O cavalo de batalha que foi o 25 de Abril começa a perder a sua força na esperança dos portugueses. Em particular das gerações mais jovens. Somos, por vezes, acusados de esquecer a importância do 25 de Abril. Pois eu vos digo que o 25 de Abril vive mais dentro de mim do que dentro de 90% dos políticos. O desejo da justiça, da liberdade e igualdade é a mesma em mim que era em meus pais no ano de 74. Vós políticos desiludiram. Falharam. Redondamente. E devem ter vergonha. Pedir desculpa. Compreender e admitir que falharam e tentar de novo. Começar de novo. Os vossos erros ao longo dos anos prejudicaram o povo português. Todos, sem excepção, são culpados. Nós também porque acreditamos em vós. A gravidade da situação não reside nos erros, mas na sua negação. Se não admitirmos que erramos não somos capazes de mudar. A culpa não é do anterior, não é deste ou daquele governo. É de todos vós. Dos que governaram e dos que fizeram oposição. Dos que não souberam planear um futuro para Portugal. De todos vós. Mas garanto que o 25 de Abril não morreu. Morrereis voçês primeiro, ignorantes, como viveram a vossa vida.

segunda-feira, setembro 27, 2004

De Momentos

Continuo a perfeição do pecado
Que é a tentativa de teu retrato.
Por entre os lençois
Vislumbro ainda a essência de
Uma semana
Que passou
Rápido.

Dir-te-ia que a memória é
Ainda
Persistente
E enganadora
Mas não te diria nada.

O carro passa, vroom
Qual quadro reflectido no tempo.
Espero por ti à boca de um copo
Neste bar pequeno.
Acendo este cigarro
Pouso o livro
E penso em ti

sexta-feira, agosto 20, 2004

Aperto

A cidade cresce
O betão que não para
O asfalto que me leva
Em direcção ao nada.

Sinto o cheiro de borracha queimada
E ouço este povo brejeiro.

Como por entre leões e anjos de espada.
Sinto vir em mim a canção do táxi
A canção das milhas que passam por estrada.
Sinto o ardor deste grito de dor
Que em meu povo ouço.

Procuro uma pedra.
De assento em que sou
Por um momento
Que passou

Vejo passar pela janela esta cidade que me agarra.
Ouço o saxofone tocar na noite de chuva.
E o homem que grita acordado.

Os sorrisos que se espalham na minha mente tolhida de cerveja...

O gorgolejar dos sinos da velha torre
Que chama por mim.
As obras que me acordam.
O banco de jardim que está molhado.

Esvoaça de encontro o jornal.
Paro na passadeira e buzina o carro.
Pessoas correm.

Olho bem o sinal de néon.
Reclama em som de ronco.
Lá dentro trabalha um anjo entristecido.
Por entre as roupas.

Entro no café.
Olá.
Vejo outra cara conhecida.
Fumo o cigarro que me foi prometido por mim mesmo.
Um dia será o fim.
Por agora deixo-o vir.
Sorrio. Dou-lhe o meu número.
Prometo atender. Ou até mesmo telefonar.
Podemos ir tomar um copo.

De copo na mão ouço o ruído.
Corpos que se encontram.
E aquela rapariga tão gira.
Peço um mais só para olhar em seus olhos.
Saio e respiro fundo.

As estrelas cairam um pouco.
Vou até á praia onde adormeço consumido pelo frio.
Acordo já o sol vai alto.

Ressacado percorro as ruas.
Sinto ainda o cheiro a mar.
Paro para uma sande.

Vejo os carros passarem lá fora
As pessoas a correr,
O sol a passar despercebido
E sinto a cidade crescer em mim.

sexta-feira, agosto 06, 2004

Quase esquecia

Mais um. Caem como tordos e, meus amigos, é triste, muito triste.



Henri Cartier-Bresson 1908-2004

Gigante da fotografia, simplicista, génio, deixa-nos a obra fotográfica, deixa-nos a Magnum, lições de humanidade e uma dorzinha no espírito.


E ainda mais triste:
« [Our enemies] never stop thinking about new ways to harm our country and our people, and neither do we. »

Se caisse uma bomba por cada "bushismo"...
Péra aí!...

Hoje é dia de...

LITERATURA DE BORDEL
(porque me apetece)

Hoje é dia temático. Olhei a prateleira. Vi aquele livro fininho com vontade de dizer adeus ao pó e pensei: "Já que não escrevo, trancrevo."
Um livrinho pequeno, mas de grande tema. É seu título "Putas à moda do Porto" e seu autor Raul Simões Pinto. A não perder. Só um pouco a abrir o apetite. Ou não...

«Aos fins de semana, os clientes chegavam a formar uma fila de espera que contornava as escadas até à rua. Qual Caixa de Previdência, Dona Carmen ia chamando um a um "os doentes de tesão" e marcava no seu livro negro, com a ajuda da velha camareira, que a acompanhava nos trabalhos de limpeza e no chegar das toalhas, o número do cavalheiro e a hora da consulta... Uma noite subi aquelas escadas, cheio de tintol, depois de um bruto jantar no Ginjal; e dei comigo, de encontro à Carmen - aflito, ela recolheu-me nos seus braços, deu-me dois beijos na cabeça e disse-me: "anda míudo, hoje és o 37...". Bom, naquela noite, andei de lado para lado, levei com umas mamas no focinho e no seu minúsculo quarto, apercebi-me que o seu cu parecia um forno crematório, e que a sua cona, mais parecia um microondas de terceira geração, tanto era o calor e os vapores de álcool que inundavam aquele cubículo. Passados dias, andava eu todo fodido com um grande esquentamento na "pichota", ferrava-me todo para mijar e suava as estopinhas com as dores. Nesse tempo, andava eu na tropa e levei no cu com quatro injecções de hidromicina, além de lavar o "stick" com purgamanato de sódio, só desta forma radical, me safei daquela maldita infecção.»

segunda-feira, agosto 02, 2004

305

Nesse quarto de hotel a promessa de um futuro. Poderemos encontrar conforto no fim do mundo? Existirão palavras que possam ocupar este lugar vazio da cama? Existe um rumo ainda na cabeça de quem quer. Existe ainda a esperança lavada de um coração intrépido. Existe um cheiro que paira no ar.
De um cigarro apontamos à fronteira da ilusão. Na noite que veio e agora se levantou, compreendemos que nada será igual. Vemos os fantasmas seguir agora caminho para bem longe. Outros tomarão seu lugar. É agora tempo de despedidas, porque ficar é sofrer. O sangue corre espesso pelas veias salientes. É hora de dormir para que possamos acordar. É hora.
A porta fecha e tudo fica escuro. O caminho já não é a direito. 305, digo eu. 305. Não mais tenho mão. Caiu. Fica ali quieta no chão e eu não a apanharei. Um dia encontrá-la-ei de novo e direi "olá" e nada será como dantes.
E agora?

terça-feira, julho 27, 2004

Férias

Vou de férias. Mal posso esperar. Procuro pelas linhas tortas com que nunca escreve certo o Deus da net os locais paradisíacos com que só me é possível sonhar. Vejo claramente as árvores baloiçarem calmamente ao sabor do vento, vejo a àgua sintilar e o seu barulho ecoa nos meus ouvidos como um doce segredo. Ao longe, no horizonte de um mar calmo o sol desce calmamente pintando o céu de tons avermelhados. Uma pequena brisa embala um qualquer inocente caminhante. A calma é o tom dominante. O futuro parece brilhante e os problemas pequenos e faceis de apertar entre os dedos até desaparecerem por completo.
Animado, saio de casa. Vou em direcção à praia. Entro no autocarro. Tenho sorte e arranjo um lugar em pé. Estou no meio do corredor e não existe oxigénio. Apenas o cheiro de um sovaco colado à minha orelha. Os putos gritam, berram, como desalmados, passam pelo meio das pessoas. Olho para baixo e vejo um passar enquanto com o braço esmaga os meus preciosos. No fundo do autocarro dá-se um arrufo entre dois jovens machos. Bofetada, estalada, pontapé, gritos, risos. O autocarro para. As portas abrem-se e penso: "Ah, uma ligeira brisa". Rápido percebo que era uma flatulância. Compreendo a táctica para ganhar um pouco de espaço. Sinto nas costas algo suave que roça contra mim. Olho, disfarçadamente. Compreendo que é o peito nu e peludo de um homem. Movo um pouco mais. Uma cotovelada mais. Um espirro. Um roçar de uma pá de praia pelas pernas, uma calcadela. Movo-me dez centímetros. E os putos gritam ainda. O sovaco é agora mais perfumado. Respiro fundo e compreendo o erro. Fecho os olhos e recordo aquelas imagens. Não tarda tudo passará. Chegarei à praia. Estender-me-ei um pouco ao sol e tudo será melhor.
Chega o fim da viagem. Dorido, desço atropelado por um senhora de dimensões rinocerontescas, por uns míudos de cara de fuínha, por dois manfias, por um pintas, e por um não sei bem o quê que me pareceu melhor deixar passar à frente. Chego à praia, por fim. Apinhada de gente não vislumbro lugar onde possa relaxar. Os míudos a correr, a gritar são em número assustador. As velhas vermelhas e os estrangeiros lagostas a sorrirem para mim. O engatatão, as miúdas feias, a peixeira a gritar, a areia pelo ar. E o mar está sujo como a porra. E eu penso em nadar por ele a dentro até chegar ao outro lado. É que não quero nada apanhar o autocarro de volta.
-Táxi!


Algo vai mal no reino de Portugal

Desculpem, mas não é possível. Eu tento, tento mesmo muito, mas não consigo estar bem. Ando inquieto, desconfiado. Não me sinto bem. Sinto um aperto enorme no peito. Sinto a catástrofe a aproximar-se. Os pássaros parecem já não cantar e este calor... Há algo de muito suspeito a pairar no ar. Sente-se mesmo um amargo de boca e não, não é do Tantum. Está tudo demasiado silencioso. Os próprios carros passam sorrateiros. Há algo de estranho, muito estranho a cobrir a nação.
Porque raio é que o Santana é primeiro-ministro? Ok, o rapaz até certo ponto pode ser considerado um amigalhaço da maluqueira, mas primeiro-ministro?
Estarei eu imerso no mundo da ilusão do sonho? Será este mundo uma espécie de castigo das minhas depravadas vidas passadas?
Não me entra na cabeça. O Santana? Primeiro? É que quando penso bem nisso, é do género: "Fonix!" (ok, é mais foda-se, mas isso é um pouco reles, não?).
Ontem reli a constituição. Alguém arrancou a página onde dizia que o Satana, desculpem, Santana não pode exercer cargos onde existe o risco de lixar um país inteiro. Porque é que o gajo não tem um saco azul e emigra pra o Brasil? Ele até iria gostar do tempo e das noites. E nós também gostavamos de não o voltar a ver.

 

Desculpem, mas não me entra na cabeça

 

 
Fonix!


segunda-feira, julho 26, 2004

O Novo Blogista

Pois é, não serei o único a utilizar esta página virtual.
Apresento-vos o Tiago. Não posso dizer muito mais. Não sou responsável pelos textos dele, nem quero. "É sempre um risco", diz ele.
Espero que gostem dos seus textos, tal como eu. Ele também gosta muito dos textos dele.


O fogo

Depois de uns dias de ausência decidi voltar, desta vez para vos falar sobre... nada. Começo a acreditar que, por este andar, este blog não vai longe.
Começou o país a arder de novo. Achei imensa piada a uma entrevista de um dos responsáveis pela coordenação, a nível governamental, pelo ordenamento das nossas florestas. Dizia ele que aprendemos a lição do ano passado. Há menos fogos, os bombeiros combatem-nos eficazmente, bla, bla, bla, bla. De repente voltei a ver aquelas imagens do Iraque: "Os americanos não estão sequer perto de Bagdad...". Neste caso "o fogo não existe em Portugal". Mas não podemos ser apenas más línguas. Temos de reconhecer que este ano tem havido menos fogos. Não sei se é por já não haver tanto terreno florestal ou se pelos serviços florestais estarem melhores, mas que há menos incêndios, lá isso há. E de certeza que este ano não houveram viagens turísticas de helicópetero. Isto é, quase de certeza (isto em Portugal nunca se sabe).
Mas o que eu gostei mesmo foi da mudança de governo. Prá direita. Acho que está tudo dito. E aquela carinha de palerma dum ministro que eu cá sei e que se chama Paulo Portas a quando da tomada de posse? Quase que valeu a pena o sofrimento destes dois anos. Quase. Ou a secretária de estado da Defesa, desculpem, das artes e espectáculos? Também foi um momento alto. Creio que este governo vale pelo poder de comunicação. Do espelho com o Santana.
Mas não quero que julguem que eu sou um daqueles que acham que os políticos são todos pérfidos, corruptos, opurtunistas. Não sou. Acredito firmemente que a maior parte é apenas imcompetente. O resto vem em consequência. E vejamos que não é fácil tomar as rédeas de um país. Se há algo que em mim existe em abundância é a compreensão. Só assim posso explicar porque não emigrei quando o Santana foi nomeado primeiro-ministro. Paciência e compreensão. Muita.
Quanto ao nosso amigo Barroso (agora sem o Durão): Afinal o gajo é um porreiraço. Gosto muito de o ver naquelas colunas do social, sempre sorridente e com a frase certa no momento certo. Estou tão orgulhoso dele. Tenho orgulho de um português que no meio de um processo difícil, ao qual a sua presença e força de vontade davam algum crédito, abandona um país e vai enfrentar os matulões do parlamento europeu. É preciso coragem, ou lata. Mas o homem é cheio de boas intenções. Capaz de renegar as suas ambições pessoais por um bem maior, o da União Europeia (Não sei porque, mas isto soa-me um pouco ambíguo). É sempre bom de ver este tipo de acto altruísta. Tenho andado a reler o "A Ratazana". «Sempre as primeiras a abandonar o navio». Confesso que gosto mais do cherne. Não dá para fazer analogias com a personalidade tão boas, mas sempre tem mais classe. Não acham?
Agora à esquerda.
Momento decisivo no PS. Todas as alas querem o poder. E com popularidade combate-se a popularidade. Temos o gordinho (parte II), o amigo simpático ( confesso que este é o meu preferido. Se um dia me vier a foder, pelo menos diz sempre as palavras certas) e o poeta revolucionário (confesso que deste não sei que diga. O meu cão também não). Imagino como será difícil a escolha. Se fosse demorada, também era bom.
Recordo-me de um pequeno cartoon com a Mafalda e a Liberdade como protagonistas em que a Liberdade fala da indecisão de voto de seu pai. Sinto-me um bocado assim. No papel tem muito mais piada.
Mas chega de pessimismo. As coisas vão melhorar. Não tenho a certeza de para quem, mas que vão, lá isso vão.
E a notícia triste. Perdemos Carlos Paredes. Voltarei a ouvir a sua guitarra um pouco mais e sei que não mais desaparecerá este calafrio na espinha. Um abraço para ti.  


Adeus e até a uma próxima.

Ricardo
 




quarta-feira, julho 21, 2004

Na Abertura
 
Sendo este o primeiro dia de escrita pensei em, cuidadosamente, trabalhar um texto, que fosse ao mesmo tempo, uma pequena maravilha literária e uma breve introdução ao Blog em si.
Depois de alguma reflexão compreendi que tal seria, no mínimo, impossível. Em primeiro lugar, as minhas capacidades de escrita deixam um pouco a desejar, em segundo lugar não existe um propósito concreto para a criação de um blog. Estava aborrecido, é tudo quanto posso dizer. Havendo compreendido estes dois pontos sugeri a mim mesmo a escolha de um tema sobre o qual falar. Uma vez mais surgiram complicações. É dificil encontrar um tema sobre o qual apeteça falar. Sou demasido introvertido. Assim pensei em falar do título do blog, "Menino da Lágrima". Assim vejamos, a sua presença em 90% das casas portuguesas é óbvia. Qual de nós não possui em casa uma reprodução deste quadro, ou não tem pelo menos um vizinho que o possua. Não conheço ninguém. A sua existência é inegável para qualquer português. Pergunto-me se não terão os emigrantes exportado esta maravilha da cultura popular portuguesa para os seus países de acolhimento. Somos conhecidos também pelo exportar de maneiras de estar, pelo que se não for o menino da lágrima, será certamente o cão de porcelana ou a última ceia. 
Apesar da veracidade do que digo, o título do blog não se prenderá, certamente, a estes factos. Poderia dizer que não possui verdadeiramente uma razão de ser, mas estaria a mentir. O nome surgiu após uma boa centena de títulos que me vi impossibilitado de usar pois algum ignóbil já os havia escolhido. Comecei a sentir-me frustrado. Foi nessa altura que na minha mente surgiu o nome: " Menino da Lágrima ". Pareceu-me bem. Confesso que já a algum tempo que este quadro tem atormentado os meus pensamentos: Quem será o pintor? De que data será o quadro? Qual o seu verdadeiro significado? Como foi possível a sua difusão? Quem foi a primeira pessoa a comprá-lo? E porquê? Estas e muitas mais perguntas preenchem partes dos meus dias, perseguem-me, como se fossem fantasmas do meu passado. Aquela pequena gota está constantemente presente em mim. Assim como os olhos tristes daquela Lassie de porcelana, mas isso ficará para uma outra altura. A única razão para o nome do Blog é desespero. Já não sabia que nome escolher. Confesso
Gostava imenso de poder ter uma imagem do célebre quadro na página, mas até ao momento não consegui descobrir nenhuma imagem na net e tenho vergonha de ir pedir a um vizinho para fazer um scan do seu querido quadro, que tão bem preenche e dá vida á sua sala escura de sofás castanhos de pano ás riscas. Faço por isso um apelo a vós, que por alguma razão haveis chegado até este ponto do texto: por favor se souberem de alguma informação que me possa ajudar a desenhar a história deste quadro, enviem um mail.
O "Menino da Lágrima" é um valioso património português, uma presença inegável no panorama cultural da nossa grande nação. Haverão muitos que não conhecerão o "Políptico de S. Vicente" de Nuno Gonçalves, nem o "Adoração dos Magos" de Grão Vasco, nem o "Descida da Cruz" de Pedro Nunes, nem o "Anunciação" de Bento Coelho da Silveira, nem o "Adoração dos Magos" de Domingos António de Sequeira, nem o "A Carta" de Alfredo Keil, nem o "O Fado" de José Malhoa, nem o "A casa de persianas azuis" de Henrique Pousão, nem o "Sinfonia azul" de António Carneiro, nem o "Procissão Corpus Christi" de Amadeo, nem o "Cabeça" de Santa-Rita, nem o "Auto-Retrato num Grupo" de Almada Negreiros, nem o "Bandeiras Vermelhas" de Vieira da Silva, nem o "Arriscar Voar" de Rogério Ribeiro, nem o "Young Predators de Paula Rego, nem tantos, tantos outros que poderiam ser enumerados, mas o "Menino da Lágrima" todos nós conhecemos, todos nós já o vimos ou, pelo menos ouvimos alguém falar.
Quererei eu que todos conhecem o meu Blog como todos conhecem o "Menino da Lágrima"? Só se for a nível inconsciente. Não pretendo fama, nem aplausos, nem reconhecimento. Só um pequeno espaço onde eu possa esquecer que o Santana Lopes é primeiro-ministro e o Paulo Portas ainda tem o nariz empinado, onde possa não me lembrar que o meu salário é apenas uma amostra do que deveria ganhar e que por este andar não poderei nunca ter uma casa apresentável, onde possa colocar de lado o facto de que uma vez mais ( e não há tribunal constitucional que me retire esta convicção ) a nossa constituição foi violada naquele pequeno artigo 74º, alínea E ( e ainda há inergumenos com coragem de ir á televisão proclamar que a minha geração não conhece a constituição ). Mas isso ficará para um outro dia. Está perto da hora de almoço e a minha barriga começa a manifestar a sua impaciência. Concluindo:
Foi uma porcaria de começo de Blog, mas se por acaso decidir voltar, seja muito bem vindo. Quem sabe pode ser que isto melhore.
Um enorme abraço.
Ricardo